domingo, 11 de setembro de 2011

Depois de ter vivido

     Ah, vai. Você chega e fala tantas coisas interessantes num espaço tão curto de tempo, sai e me deixa sentada, descabelada e atordoada, digerindo cada palavra sua. Deveria ser proibido ser interessante e charmoso antes do meio-dia, e se proibido fosse, não seria algo com o qual você se preocuparia...
     Não sei se é a paisagem, o frio ou a tatuagem, mas o foco se tornou todo seu. Seria insanidade não passar o dia ouvindo sobre suas viagens e paixões, reparando que seu sorriso se abre mais pro lado que você olha e que, quanto mais rouca sua voz se mostra, mais irresistível você se evidencia. Encantador, sedutor... Hipnotizante, até.
     Se em 24 horas me causou tanto furor, o que me causaria em 24 anos, em 24 vidas? Para ser interessante não é preciso ser bonito, forte, alto, intelectual ou rico, é preciso saber ser interessante somente, e charme e destreza você tem de sobra, oriundos da vivência talvez... Talvez seja proposital, para ver meninas boquiabertas com o seu passar, no fundo eu sei que você se diverte com a loucura que chama de vida. E eu só quero, nem que seja por um segundo, fazer parte dela.
     Mas voltemos à vida normal. Estudos, amor, família, religião, televisão e futebol, em nada disso você se encaixa, meu querido souvenir. O tempo se passaria e o foco seria reajustado, voltemos às prateleiras do presente, sem espaço para doces enfeites! Mas daqui a um tempo, eu sei, a gente ainda há de se encontrar...
     Mais de 365 dias se passam e cá estamos novamente. E você ainda me causa a mesma cólera do primeiro e único dia. E cada vez mais minhas mãos se tornam gélidas, culpa desses seus elogios e abraços contínuos. E você ainda se diz impressionado com a minha beleza, com os meus anos... E eu, que ainda enlouqueço com os seus? Mas tudo vai bem, obrigada.
     Nossos encontros anuais só me mostram que a cada ano que passa, você se torna mais interessante. Sua voz rouca, seu nome, seu gingado, seu cheiro, seus braços, tudo me convida a essa dança que aos poucos, evolui e dessa pista eu não saio mais! Você grita aos quatro ventos minha juventude, minha beleza, e eu calo todas essas linhas, por que quero mas não me rendo. E você tenta, me tortura, me destrói, mas eu ergo a sobrancelha e me faço de desentendida, me recuso a entregar as cartas no melhor do jogo... Só eu sei o quanto esperei por isso.
     Somos a prova de que eclipses e cometas podem ser vistos mais de uma vez a cada ano. Eu caio no mundo e te encontro, você diz que estou cada vez mais linda e me desfaço por dentro, por fora eu sorrio acanhada, você sabe, oposta a toda sua desenvoltura e malandragem... Enquanto os minutos passam, penso em todas as coisas que quero da vida, em todas as coisas que quis e em todas as minhas conquistas, me pergunto se é isso mesmo e qual a graça e o gosto do depois, depois que a gente vence. Talvez você não valha metade dos meus pensamentos ou das minhas vontades, reflito e dou meia volta, mas é aí que o perigo mora. Você sorri como quem impede tal desistência, me toma em seus braços, me puxa pra perto e me faz sentir o gosto de cerveja que a vitória tem. Que toda espera tem sua recompensa e o que eu já sabia: que quando estivesse próxima, só o céu seria o limite... Mas vai que o encanto acaba às 6h? Minha carruagem me espera e o caminho é longo, mais um beijo com sabor de "até breve, quem sabe?" e menos uma tarracha de brinco na minha coleção.
     Vida normal, meu querido souvenir. Te guardo como uma peça feita de argila comprada em uma feirinha de Santa Teresa, feita à mão e bem malandra para nunca esquecer. Mas amanhã é outro dia e ainda sim, não nos veremos, mas nada que mais 23 vidas não resolvam, ou até o mês que vem, quem há de saber? Quero mais dessa vitória com gosto de cerveja e dessa felicidade musical, com direito a música ao pé do ouvido e tudo! Mas isso é papo para outro dia...